Friday, April 6, 2007

Presença



Alvoroçada, arfante, Leónia raspou, então, ambas as garras pelo rosto, do qual escorria aquela amálgama de porcarias, suores e de pêlos. Dolorida, contaminada. Instantes depois, recobrava o ânimo, enquanto ia passando as que já eram mãos por todo o corpo, até tornear em si a forma humana.

Lambeu, com uma última delícia de animal, os lábios ainda entumecidos, onde havia alguns resquícios do sangue que, pouco antes, regurgitava pelo pescoço da sua vítima. Os dentes que lhe cravara, com o frenesim de predador, tinham-se reduzido ao aspecto banal num facies feminino.

Além da bruma densa que castrava o olhar furtivo de Leónia, o espesso matagal permitia-lhe escapar a qualquer assalto de surpresa ou curiosidade. Compôs-se, pois, com os andrajos esfarrapados que lhe restavam, disfarçando a loba ávida sob uma felina sensualidade, que lhe era tão natural.
15MAR2007

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